Na obra de cunho biográfico, intitulada Medo e Delírio em Las Vegas, Hunter Thompson, considerado o pai do Jornalismo Gonzo, nos apresenta o jornalista Raoul Duke, que junto com seu advogado samoano, atravessam o deserto em um conversível vermelho, com o porta malas cheio de todos os tipos de drogas licitas e ilícitas, para cobrir o evento Mint400 em Las Vegas.

               A obra de Hunter Thompson é um daqueles livros que podem ser facilmente considerados um representante de sua época. O enredo, através de uma viagem insana de um repórter e seu advogado, relata a busca pelo idealizado “Sonho Americano” que foi deixado para trás pelo espírito americano dos anos 70: roqueiro, drogado, violento e sexualmente liberado. O filme de mesmo nome, dirigido por Terry Gilliam, e lançado em 1998, conseguiu em muitos momentos transparecer o estilo cômico e ácido de Hunter Thompson. Juntamente com um visual surrealista e a narração do personagem, mantida pelo diretor, temos como resultado um clima de completa insanidade, que traduz muito bem a obra em que foi inspirado.

                    O autor utiliza de diversas referencias da cultura americana da época durante a narração da história, o que valoriza muito a escrita e nos informa sobre diferentes acontecimentos de uma forma muito próxima do jornalismo. Podemos contar também com um humor muito cru e direto, onde o autor é bem direto ao ponto e utiliza uma linguagem regada de palavrões e gírias da época.

             Toda essa abordagem direta foi inserida com sucesso no filme através da narração do personagem principal, que foi mantida pelo diretor e consegue nos passar exatamente o que o personagem esta sentindo e pensando, mesmo estando totalmente drogado a maioria do tempo. Muito da estranheza do filme é passada através de seu visual que explora diferentes planos de câmera, desde closes até pontos de vista para simular o efeito das drogas nos personagens, até a escolha de cores e figurinos, que retratam a época em que se passa a história de forma bem característica e cômica.

         Também é interessante como em alguns momentos fica um pouco difícil de entender o que está acontecendo, visto que a história é contada do ponto de vista de uma pessoa sob o efeito de drogas. Do mesmo jeito é interessante ver o personagem fazendo um grande esforço para parecer sóbrio e não denunciar o seu real estado, usando da sua inteligência, muitas vezes, sorte para enganar as pessoas ao seu redor.

            Ao decorrer da história, tanto o livro quanto o filme ameaçam ficar um pouco monótonos, visto que os acontecimentos decaem. Porém o autor retoma o ritmo focando a narrativa nos conflitos internos do personagem principal e nos diferentes encontros com outros personagens que ele tem durante o enredo. Essa postura politicamente incorreta mantida no filme foi muito bem traduzida pelo diretor e pelos atores Johnny Depp, que interpreta Raoul Duke, e Benicio Del Toro, que interpreta o advogado Dr. Gonzo.

            É uma história que vale muito a pena ser lida pelo teor de seu conteúdo, considerado improprio para a época, e pela crítica que ela apresenta, juntamente com a narrativa direta e cômica. Porém, acredito ser um livro para ser lido de uma vez só, tanto para não quebrar a narrativa insana de uma road trip, quanto para evitar o sentimento de confusão e em partes de lentidão e queda de ritmo, o que acontece também em certas partes do filme, mas logo volta ao ritmo inicial.

            Vale mencionar a citação presente no livro e no início do filme que, de certa forma, resume bem a essência da história:

“Quem faz de si um animal selvagem fica livre da dor de ser um homem” – Dr. Johnson

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